
Deixou no chão a última peça e delicadamente caminhou nas pontas dos pés. E como um dedilhar cada passo era um toque singelo. Quiçá o chão sentisse, sentiria tamanha leveza que lhe seria carinho.
Um frio com raízes internas e um frio que lhe subia do chão, pelos delicados pés.
Já era tarde, e seu sentimento de solidão transpunha a pele, transpunha os limites da alma, alcançava o corpo. Seu corpo respondia a solidão, estremecia de frio. Tanto que, de repente, o frio era real. Na mesma medida da solidão.
A luz amarela fraca no banheiro trazia doces lembranças. Dos dias naquela velha casa, com aqueles seus velhos: velhos amigos, velhos hábitos, velho quarto, velho refúgio, velho ser...
Estava em silêncio. E queria sentir. Pensar era excedente para este momento tão transcendental de se aquecer, de tocar. Um sorriso surge sim ao se deparar com essas doces lembranças. Mas ansiava rodar a torneira e sentir a água quente relaxando e tocando seu corpo. Precisava do toque, e a força, a harmonia com que ela desceria nos muitos pontinhos acima de sua cabeça, proporcionariam quietude. Os pés, então, se interrompem na sua jornada. E assumem o natural de si, a sabedoria de escolher o caminho, a sabedoria de andar... voltam. Apagam a luz. Agora ninguém atrapalharia seu momento. Nem as mais doces histórias interromperiam o toque que a água lhe seria. Nem um só som mudaria o silêncio e a paz desta chuva.
Abre e sente. Molha seus cabelos e umedece o corpo até amolecer a alma. Fecha os olhos. Não existe mais mundo. Só os seus sentidos e a chuva. Sente o derreter da solidão, o desaguar de si. O carinho. A chuva e o amor.
E agora percebe como é incrível ser um conjunto de tudo isso. Um conjunto de secura e umidade, um conjunto de alma que esfria o corpo. Um conjunto de corpo que esquenta a alma. Um misturar de si com a chuva.
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Ah...fui indicada lá no Entre Vistas (http://entrevistasvirtuais.blogspot.com/) ...